sábado, 8 de maio de 2010

Tudo pode dar certo com um Woody Allen menos amargo e mais gozador

Se a discussão girar em torno da empatia, Vicky Cristina Barcelona sai disparado na comparação que inventei na minha cabeça entre os últimos cinco filmes de Woody Allen, diretor com quem, e com cujos filmes, estabeleci uma intensa relação afetiva, que talvez me impeçam de ser imparcial, ou, quem sabe, pelo mesmo motivo, não.

(Caso seja a parcialidade a opção vigente nesse momento, minha defesa é que quanto mais estudo jornalismo, menos acredito na imparcialidade do ser humano e, conseqüentemente, do jornalista. Mas essa reflexão não cabe aqui; desviaria do assunto – cinema, e também não teria fim: tenho a impressão de que se seguir, de fato, essa carreira que eu escolhi estudar, vou passar o resto da vida refletindo sobre essa bendita questão/contradição do jornalismo: as tais imparcialidade e objetividade jornalísticas)




Voltando a Woody Allen. Assisti a seu novo filme, Tudo pode dar certo, na sua estréia nos cinemas brasileiros, há uma semana - e não, eu não escrevo estreia corretamente segundo a nova gramática(?).

A impressão que tive, embora não houvesse uma María Elena e um Juan Antonio por quem me apaixonar, é que esse é o melhor filme do diretor desde Match Point. Acho, inclusive, que este último dialoga abertamente com o primeiro desses cinco filmes (Match Point, Scoop, O Sonho de Cassandra, Vicky Cristina Barcelona e Tudo Pode Dar Certo, respectivamente), e talvez isso o enriqueça bastante.

Match Point anuncia desde o título que é um filme sobre a sorte. A referência ao ponto final do jogo de tênis e ao conceito de jogo mesmo, porque em algum momento, em qualquer jogo, a sorte pode mudar a situação, e não importa quanto você tenha se preparado, ou não, para esse momento, ele não depende inteiramente de você. E é exatamente isso que acontece diante de nossos olhos embasbacados em Match Point: um crime hediondo, terrível, desses que acontecem sempre por aí, e somos testemunhas, mas não faz diferença, porque o descuido do autor é o que salva sua pele.

O que temos em Tudo Pode Dar Certo, ou, no original, Whatever Works? Um brilhante físico quase ganhador do Nobel que, pelo amor de deus, perto do Alvy Singer de Annie Hall ou mesmo do Dobel, no mais recente Igual a Tudo na Vida, é um louco desvairado e que, ainda por cima, canta parabéns-à-você enquanto lava as mãos. Nem preciso, mas vou dizer: Larry David é o grande responsável por esse personagem, perdoem o trocadilho, dar tão certo. O cara ligou as neuroses do Woody Allen nos 220!

Esse homem, Boris Yellnikoff, acha a vida previsível e desprezível, porque, no fim das contas, todos vamos morrer, e cada vez que ele se lembra disso é um deus-nos-acuda, para ele e para todos os outros personagens do filme, menos para nós, felizes espectadores, de cuja presença, aliás, ele é consciente. Mas a verdade é que ele não contava com a aparição de Evan Rachel Wood (que, na minha opinião de menininha-quase-da-idade-dela, é sensacional) interpretando Melody St. Anne Celestine, moça fugida do interior, extremamente religiosa e conservadora, que se apaixona por ele.

Era tudo que ele não queria, mas daí pra frente qualquer coisa pode acontecer e acontece. Se Boris jamais imaginaria conhecer Melody, imagine o que acontece quando nos deparamos com a mãe dela, vivida por uma Patrícia Clarkson (saída diretamente de Vicky Cristina Barcelona?) maravilhosamente louca?

Porém, por trás do imprevisível, ainda há Nova York, pelos olhos do diretor e do seu rabuegnto alter-ego, os monólogos calçadas afora, o jazz, o Central Park, as reflexões e as piadas, e já nem sabemos mais qual é qual.

Pensando bem, não é só com Match Point que Tudo Pode Dar Certo conversa, em Vicky Cristina Barcelona há a celebração da vida e do amor, sem convenções e aparências que também aparece nesse filme. Em Annie Hall, o protagonista já fazia reflexões mirando a tela como se nós, do outro lado dela, estivéssemos ouvindo (e não e que estamos?).
Mas acho que gostei muito da relação entre Match Point e este último filme porque, comparado ao primeiro, Woody Allen aparece menos pessimista agora, embora continue debatendo os mesmos temas.

Amargo e dramático ou divertido e gozador, ele continua falando sobre as mesmas coisas, mas eu realmente acho isso fantástico, porque sua obra é fiel ao que ele pensa e sente em relação ao mundo, e nos permite observar a vida junto com ele, através de seus filmes. Mais fantástico ainda é que da mesma forma que saímos destruídos de Match Point por conta da inevitabilidade da sorte e das circunstâncias, quando a inverossímil história de Boris termina, sabemos que, de algum jeito, tudo pode dar certo.

Um comentário:

Felippe Lepiane disse...

uhahuahuauh eu adorei esse filme!!! recomendo a todos!!